quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Berlin - Jerusalém: Diário #3

05.12.11

Parte II


   Agora descreverei a minha experiência em ordem cronológica, acredito que seja a forma mais conveniente de não me perder na confusa sucessão de sentimentos por que passei. 

Ao chegar aos portões de Birkenau me vi num filme, não me passou a sensação de realidade, parecia um grande cenário de Hollywood. Nosso guia, polonês, nos deus as primeiras instruções sobre a historia do local, falarei um pouco mais sobre ele à frente. Seguimos ladeando os trilhos centrais do campo. A primeira parada foi ao lado de um vagao de madeira. Esse era o tipo de transporte usado pra trazer os prisioneiros. Relativamente pequeno. A jornada podeira durar de três dias a três semanas, pois pessoas da Itália e França também foram enviadas. Sem luz, com um balde para as necessidades, pouquíssima água e centenas de pessoas dentro. Era comum chegar muitos já mortos. Ali comecei a realizar onde estava. 



Andamos alguns metros ate o ponto de desembarque. Nesse local, me questão de segundos, o medico nazi classificava quem morre e quem vive. Algo aconteceu.


Um grupo grande de turistas cruzou por nós, éramos oito ou nove, eles mais de trinta. Um silêncio sepulcral quebrado pelo atrito de uma pedra sobre a outra. Pernas pesadas arrastando pés relutantes, ombros baixos carregando toneladas. Imediatamente me veio à mente a imagem de documentários e filmes, das filas imensas de prisioneiros chegando aos campos de concentração. Aquela marcha me deu a primeira ideia do que estava por vir.

Seguimos até o final dos trilhos, lá a um monumento com os seguintes dizeres em várias línguas:


As câmaras de gás estão em ruinas, mas essas foram as primeiras realmente construídas para exterminar pessoas em escala industrial. Veio à minha cabeça que pessoas cremadas não desintegram, há cinzas, o que foi feito com elas? Simplesmente jogadas pelos campos de Birkenau. Eu estava andando sob as cinzas de 1,1 milhões de pessoas! É o maio cemitérios do mundo. Ao final da resposta eu só queria sair voando dali, só para tirar meus pés daquele lugar.             


Passado o susto, andamos cerca de cem metros e adentremos em um dos galpões de tijolo. Não há proteções contra o frio, o telhado esburacado e dois aquecedores ridículos que constantemente não tinham lenha para queimar. Por todas as paredes e no meio do galpão há beliches de três andares, o primeiro no nível do chão. Cada cama com 1,5 x 1,5 m², mas ali dormiam mais de dez pessoas.





Uma coisa repugnante que não posso deixar de falar é que praticamente todos sofriam de diarreia. Havia alguns baldes para os dejetos, mas pouco para as mais de mil pessoas que viviam ali. Tudo era feito nas calças, muitas vezes ainda deitados nas camas, o excremento escorria pelo beliche, gotejando em quem estava a abaixo. Importante dizer que, durante o dia estavam trabalhando e durante a noite não podiam sair dos alojamentos. Não havia escolha ou não havia forças para se levantar.


O galpão de Birkenau foi difícil, mas eu precisava de mais para me impressionar, eu quis e tive muito mais do que pedi.


Tomamos o ônibus de volta à Auschwitz I. ARBEIT MACHT FREI – TRABALHO FAZ LIVRE é a famosa inscrição que nos recebeu dentro de Auschwitz I. Se igorarmos as cercas, pode-se até imaginar que é um condomínio residencial compredios de três ou quatro andares. Mas isso só por fotos, porque o ar é ésado, a tensão é palpável. Andamos até um antigo deposito de armas do exército polonês. Essa galpão foi transformado pelos nazis numa câmara de gás imporvisada. Mais de sessenta mil pessoas morreram ali.



Aqui paro a historias para falar sobre nosso guia. Uma coisa que ele fazia primorasamente era nos dar tempo para pensar e absorver o que era arremessado em nossas faces. Cada objeto pessoal que nos era apresentado, o guia fazia questão de lembrar aquilo pertencia a uma pessoa como eu, como você e como ele. Indaguei por quanto tempo ele era guia, me respondeu por cinco anos com uma voz quase inexistente. Perguntei como se sentia fazendo aquilo por tanto tempo. A resposta foi curta “É sempre como a primeira, não dá pra se acostumar”, Invitalvelmente veio à minha boca “Por que você faz isso então?”. “O que aconteceu aqui não pode ser esquecido, estou fazendo a minha parte, você fará a sua contando pra quem não pôde vir. Entretanto, de tempos em tempos eu preciso de uma pausa, a tensão parece que acumula.” Só reclamo de uma coisa sobre nosso instrutor, ele insistia em dizer “os alemães” fizeram isso e aquilo. Pra mim não, quem fez a guerra e  o Holocausto foram os Nazis, duas coisas bem diferentes.


Nosso guia pede silêncio absoluto dentro da câmara, tira o gorro e puxa a fila. No primeiro passo, um trem é colocado sobre nossas costas, caminhei lentamente e relutante. Posicionei-me para uma foto, em busca de um bom ângulo acabei me escorando na parede. Foi como um choque! Realizei imediatamente que estava tocando uma parede que abafou os gritos desesperados de milhares de vidas. Afastei-me quase com um salto. NA sala ao lado havia o pequeno crematório, também improvisado. Havia uma rosa sobre as tampas dos fornos.



Começamos uma caminhada entre os prédios, começava a escurecer.


Entramos num bloco que exibia objetos tomados dos prisioneiros. Óculos, roupas, sapatos, pentes e tudo que uma pessoa pudesse carregar numa mala. Duas coisas foram especialmente chocantes. Os cabelos cortados eram vendidos para empresas alemãs e usados como perucas ou eram transados e usados em cobertores, lençóis e travesseiros.

Alguns prisioneiros foram “heróis” da primeira guerra, muitos com amputações e lesões graves. Esses tinham próteses, que foram confiscadas e seus donos assassinados. Tais objetos foram encaminhados para soldados arianos do exercito nazi. 



Já escuro e somente nosso grupo caminhando pelo complexo de Auschwitz I, chegamos ao Bloco 11. Esse prédio era para os presos do campo, isso mesmo, dentro do campo de concentração havia ainda uma forma de ser preso. Lá a criatividade da tortura era posta à prova. Além de inserir água fervente em narizes e bocas, podemos destacar as celas que haviam ali.




Como disse o guia, tensão acumula. Quando chegamos à escada que antecede o porão do Bloco 11 eu já não conseguir me controlar. Coração disparado, mãos tremulas, não consegui tirar mais nenhuma foto, respiração rápida e estomago ridiculamente enjoado. Desci cada degrau vagarosamente e temeroso. Antes do primeiro corredor uma das mulheres do nosso grupo voltou e desistiu de prosseguir. Visualmente não há nada muito assustador, mas é impressionante o quanto o clima é pesado.


Praticamente me arrastando passei pela cela onde homens eram deixados para morrer de fome. Mais à frente havia três portinholas próximas ao chão. Elas davam acesso a uma sala de um m2, porém alta. Quatro prisioneiros eram colocados lá, assim não havia como se sentar. Eram postos em pé após doze horas de trabalho e assim, em poucos dias, morriam de exaustão. Não esperei o guia, simplesmente saí do prédio o mais rápido que pude.




Ultima parada foi ao lado do Bloco 11. Os que ainda insistiam em sobreviver eram executados à bala de baixo calibre naquele paredão. Atravessei o portão e não consegui me aproximar mais de três passos além dos cinquenta metros que me separavam do muro.


A tensão ACUMULA!!! Eu estava no meu limite.


Aquele pequeno grupo caminhou sozinho, calado, sob a fraca luz de lâmpadas ineficientes de volta ao lugar que iniciaram essa jornada, mas com toda a certeza, ninguém era mais o mesmo.

 

3 comentários:

  1. Eu estava esperando a hora que você ia dizer que ficou com nauseas... eu acho que vomitaria.

    É difícil imaginar o que passava na cabeça dessas pessoas que fizeram o que fizeram com seus semalhantes... e mais difícil ainda é que por mais que tentamos imaginar a dor dessas pessoas não iremos conseguir passar nem perto de 1% do que realmente sofreram...

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  2. é surreal mesmo, demora algum tempo pra vc percerber q nao esta num filme. Nao parece real!

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  3. Nossa, você foi falando e me vieram todas as cenas do "O menino do pijama listrado" e já surgiu a mesma sensação horrível de quando vi o filme, que particularmente me afetou muito. Quero ouvir todas as histórias!

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